O projeto “Saúde em Igualdade”, da Associação ILGA Portugal, teve como principal objetivo a recolha de dados empíricos sobre os desafios e as barreiras que as pessoas lésbicas, gays, bissexuais e trans (LGBT) encontram no acesso a cuidados de saúde adequados e competentes.
O projeto foi financiado pela ILGA-Europe no âmbito do seu .Human Rights Violations Documentation Fund. Esteve em curso durante o ano de 2014, tendo a recolha de dados sido efetuada entre junho e novembro. Participaram no projeto 629 pessoas (600 participantes LGB e 29 participantes trans), através do preenchimento de questionários de auto-relato. Foram ainda realizadas entrevistas a um pequeno grupo de profissionais de saúde.
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PRINCIPAIS CONCLUSÕES
Ser-se lésbica, gay, bissexual ou trans (LGBT) não pode constituir em si mesmo uma barreira no acesso à saúde. Contudo, os resultados deste projeto são inequívocos a mostrar que as pessoas LGBT deparam-se com várias dificuldades no acesso a cuidados de saúde adequados e competentes.
A invisibilidade das pessoas LGB, e o silêncio sobre as suas identidades e comportamentos, é também a regra em contextos de saúde. Cerca de 70% dos/as profissionais de saúde pressupõe que o/a utente à sua frente é heterossexual ou que tem comportamentos sexuais exclusivamente com pessoas de sexo diferente. Mais: quando formulam questões relacionadas com sexualidade e conjugalidade apenas 17% dos/as profissionais o faz de modo a incluir a possibilidade do/a utente ser LGB.
Assim, são as próprias pessoas LGB que têm de contrair o silêncio e a invisibilidade que incidem sobre si, apesar da hesitação relacionada com a expetativa da discriminação e com processos de estigmatização. Sessenta e seis por cento dos/as participantes indica que o facto de antecipar ser tratado/a de forma menos adequada interfere na sua disposição para mencionar a orientação sexual ou comportamentos sexuais em consultas médicas. Cerca de 30% dos/as participantes nunca falou com nenhum/a profissional de saúde sobre a sua orientação sexual. Aliás, 37% já a omitiu em situações clínicas nas quais seria importante o/a profissional ter essa informação. Em praticamente metade das situações o/a médico/a de família não tem conhecimento da orientação ou comportamentos sexuais dos/as utentes LGB. E 25% das pessoas LGB com filhos/as esconde do/a pediatra a sua estrutura familiar.
Apesar do silêncio sistemático revelado por estes dados, 17% das pessoas LGB já foi alvo de discriminação em serviços de saúde, incluindo: comentários feitos pelo/a profissional e que foram sentidos como um insulto; desconforto no contacto físico com o/a utente depois deste/a indicar que é LGB; barreiras na doação de sangue por homens gays ou bissexuais; ou dificuldades no acompanhamento de companheiros/as do mesmo sexo em consultas ou internamentos. Em 11% dos/as atendimentos de saúde mental foi sugerido ao/à utente que a homossexualidade pode ser “curada”.
A invisibilidade conjugada com a discriminação sentida ou esperada, resulta num acesso inferior a cuidados e serviços de saúde: pessoas LGB evitam ou hesitam em (e, em alguns casos, deixam de) recorrer a profissionais e serviços de saúde. Cerca de 40% das pessoas LGB procura informação prévia sobre profissionais ou serviços de saúde, de forma a minimizar o risco de discriminação. E 32% pensa “duas vezes” antes de se dirigir a um serviço de saúde.
Os dados recolhidos pelo projeto mostram também que as barreiras – já identificadas no passado – no acesso à saúde por pessoas trans continuam atuais, nomeadamente: o não cumprimento das guidelines internacionais; a necessidade de aprovação pela Ordem dos Médicos para o acesso a tratamentos específicos; ou, o desconhecimento geral sobre práticas e recursos disponíveis no Sistema Nacional de Saúde.
Os dados são claros: as pessoas LGBT encontram barreiras e desafios significativos no acesso a cuidados de saúde adequados e competentes. É fundamental a implementação de políticas públicas que garantam que os contextos de saúde sejam contextos seguros, nos quais o silêncio e a discriminação em função da orientação sexual e identidade de género são inaceitáveis. Também na saúde, a igualdade tem de ser a regra.
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